O projeto do plano-diretor para o campus Lagoa-Marcosende da Universidade de Vigo, na Galícia, é estruturado por uma nova proposta de circulação e utilização do terreno, e pela interligação dos conjuntos de edifícios existentes com pontos notáveis do campus, sobretudo com a praça central de convivência.

O plano de ocupação anterior, realizado na década de 1990 pelo arquiteto espanhol Enric Miralles, havia definido como eixo estruturador do campus a curva do nível 460, onde se situa a área de instalações notáveis do campus: biblioteca, reitoria, conjunto esportivo, centro comercial e praça de convivência. Foi a partir dessa cota que se constituiu o partido do novo projeto, que rompe com a distribuição anterior dos edifícios, isolados em áreas determinadas pela topografia acidentada do terreno, por meio de um conjunto de vias de circulação elevadas, expandindo a cota 460 no espaço. O projeto foi elaborado como um sistema de vias principais articuladas às ligações secundárias, algumas preexistentes, como as passarelas do complexo das Ciências Jurídicas e Econômicas ou as conexões construídas no Centro Tecnológico. Por meio dessa articulação o sistema permite a circulação horizontal de pedestres em ambiente protegido das adversidades climáticas, com independência dos diversos níveis da ocupação da topografia acidentada, favorecendo a convivência e o intercâmbio na vida universitária.

De modo análogo e oportuno, o sistema foi concebido também para organizar a localização e a distribuição das infra-estruturas de energias elétrica e hidráulica em “corredores técnicos” constituídos entre as treliças da estrutura das vias elevadas.

Além de articular as instalações existentes, as vias elevadas integram áreas do campus de difícil acesso e constituem uma matriz de organização da construção das futuras ampliações necessárias à universidade. A expansão é orientada por três vias principais: uma via no sentido leste-oeste, que prolonga a cota 460 e se desenvolve paralela à área de convívio, e, na direção norte-sul, dois eixos nas cotas 430 e 425, que estabelecem a relação com os setores de tecnologia e de ciências marítimas.


Cinco grupos de elevadores e edifícios-garagens, em posições adequadas, fazem as ligações entre as vias elevadas e as instalações implantadas nos outros níveis da acidentada topografia. Imagina-se que nas vias elevadas, com a circulação de pedestres e de pequenos veículos elétricos para o transporte ágil de equipamentos leves, livros e documentos, ocorra uma rica convivência dos usuários do campus em seus 12 m de largura.

Um tanto imprevisível, essa convivência poderá ser amparada por uma série de serviços: pontos de vendas de materiais didáticos e de papelaria, de jornais e revistas, máquinas de bebidas e de lanches, caixas automáticos para saque de dinheiro, postos de informação e exposição, central de inteligência e  segurança, instalações sanitárias. Alguns cafés podem ser instalados nos extremos dessas ruas suspensas, onde foram situadas atraentes varandas. Nos acessos principais às vias elevadas, assim como nas pontes de ligação em nível com a cota natural 460 e nas conexões com os edifícios-garagens, foram previstos postos de informação geral.

As vias elevadas constituirão, assim, alternativa atraente para a circulação, preservando a integridade do território natural, para uma reconstituição paisagística como novo projeto. Esses recintos naturais preservados sempre serão, nos dias agradáveis, um caminho, passeio para todos. O paisagismo deve reconstituir ao caráter natural sua geomorfologia, hidrologia, flora e fauna, estendendo o conceito de constituição de uma reserva ecológica para todo o campus. Trata-se da procura de uma convivência ideal entre natureza e construção.

De modo coerente com essa espacialidade recém-criada, as novas construções no campus também devem se acomodar ao terreno natural de modo peculiar, mantendo o mais possível a integridade desejada. A verticalização dos novos edifícios, que é pressuposto desse plano geral, cria uma nova implantação diretamente vinculada à cota das vias elevadas. A construção futura deverá se desenvolver para cotas superiores e inferiores, de acordo com as circunstâncias, tocando o solo natural com o mínimo necessário para sua articulação com o sistema viário e com os delicados usos que se beneficiam da proximidade dos jardins no território natural.

(texto publicado no livro ROCHA, Paulo Mendes da. Paulo Mendes da Rocha: projetos 1999-2006. Organização Rosa Artigas. São Paulo: Cosac Naify, 2007, pp. 115-116.)